Pétalas Negras - Angela Vera
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- Calcular freteComo um poema-rio, Pétalas Negras percorre em poesia os acontecimentos, o trauma e a recuperação de uma traição – o período da vida em que, como o título sugere, os sentimentos se obscurecem, da mesma forma que as pétalas desprendidas da flor, metáfora das mortes sentimentais.
A obra se divide entre a desesperança e a esperança, o luto e a necessidade de prosseguir, ao longo de três movimentos sinfônicos: “traição”, “esquecimento” e “a mulher experimental”. É o fio das moiras, que segundo a mitologia grega tecem o destino, nesse caso das separações traumáticas: primeiro o choque e a dor, depois o entorpecimento e, por fim, a reconstrução.
A poesia de Angela Vera fala pela mulher, mas não tem gênero: trata da maior das decepções, um sentimento universal. A traição do parceiro com que lida não é carnal, e sim moral: para ela, “sem caráter, o amor vira deserto”. Dá vazão à raiva, ao ódio, ao desprezo, que aos poucos se transmutam em autoconhecimento, base para o futuro, tema do poema “A mulher experimental”.
A desilusão com a “pessoa viva que morreu” decorre especialmente da mentira, da frieza e da maldade com que foi perpetrada a separação, conforme o tempo vai revelando. Transmite a sensação de que nunca conhecemos quem achamos conhecer, e que tudo pode se esperar do outro, a qualquer momento.
Há sequelas de longo prazo: a destruição da confiança dificulta a retomada de novos relacionamentos, que, aos olhos do traído, passam a ser perigosos.
Pétalas Negras fala intimamente com quem experimentou a decepção do amor da sua forma mais cruel. Apesar da sua temática, e do seu impacto, é também suave, como um ombro amigo, a companhia consoladora, que embala a alma de todos os que já se desapontaram e sofreram com o amor – uma ou mais de uma vez. E aponta a saída, dolorosa, lenta, gradual, porém necessária para o amadurecimento e uma nova base do que se entende por felicidade.
A AUTORA
Angela Vera é uma escritora e poeta paulistana, que escreve sob pseudônimo por ter enfrentado a perseguição do antigo cônjuge, depois da separação.
Vítima de um ataque judicial, foi acionada na esfera criminal por “violência psicológica”, relacionada à publicação de um livro de poemas de amor que, segundo a acusação, caracterizaria uma exposição da privacidade do ex-marido. A ação criminal foi acompanhada de outra, na esfera civil, em que ele pedia uma indenização por “danos morais”.
Submetida a uma ordem de restrição que a obrigava a retirar o livro de circulação, junto com o texto e imagens ilustrativas utilizadas na divulgação da obra, enfrentou as acusações na justiça por três anos. Na ação por danos morais, das cerca de 700 páginas do processo, mais de 400 eram páginas de livro com poemas de amor.
Teve de demonstrar em juízo que a obra tinha sido consentida, tendo sido publicada seis anos antes, e a denúncia, ocorrida um ano após a separação, coincidia com a união do ex-marido com uma nova companheira, que atuava como a sua única testemunha, e se encontrava como ele em dificuldades financeiras.
Os poemas de Pétalas Negras foram escritos ao longo do tormentoso período entre o início das ações e sua conclusão. Ao final, sua condenação foi o trauma de toda essa experiência. A transformação dos registros de amor numa ferramenta para a vingança, que perpassa “Pétalas Negras”, é um choque violento: expõe a maldade da sua forma mais genuina e produz não apenas o esvaziamento das boas lembranças, assim ressignificadas, como da própria crença no amor e no ser humano.
A própria autora define o sentido da obra nos versos de um dos poemas, “Cantiga de amigo” - referência à poesia de origem provençal em que os antigos trovadores escreviam sob pseudônimo para falar livremente das dores de cotovelo, sempre na voz de uma mulher:
Eu queria calor
uma cantiga de amor
ficar ao abrigo
não ter que sofrer
nem me arrepender
apenas aprender
a viver e aproveitar a vida
mas em vez da cantiga de amor
esta é uma cantiga de amigo
cantando o que resta de dor
e de um certo medo de amar